Observatório da Paz reforça o papel dos jornalistas guineenses na prevenção do radicalismo e extremismo violento

41 jornalistas participam numa formação sobre técnicas para a deteção de sinais de radicalização e criam Rede de Jornalistas para a Prevenção do Radicalismo e Extremismo Violento na Guiné-Bissau.

Os jornalistas podem desempenhar um papel fundamental na Prevenção do Radicalismo e do Extremismo Violento (PREV), através da informação e educação do público sobre esta temática. Nas rádios comunitárias, nas redes sociais e blogues, nos jornais e media públicos e privados, podem ajudar a esclarecer as causas da radicalização e a forma como esta pode ser abordada. Além disso, a cobertura responsável dos meios de comunicação social é essencial para fornecer informações exatas que contrariem as narrativas extremistas ou os esforços de desinformação, inclusive a nível político, que possam contribuir direta ou indiretamente para incentivar o conflito étnico e religioso.

Os jornalistas têm uma oportunidade única de fornecer informação e contexto que podem ajudar as pessoas a compreender melhor por que razão certos grupos ou indivíduos adotam ideologias extremistas. Ao fazê-lo, podem desempenhar um papel importante no combate a essas ideias antes que elas conduzam à violência. São igualmente uma salvaguarda contra o uso pelos decisores políticos ou líderes partidários de discursos de ódio ou agendas radicais sem escrutínio público ou responsabilização.

Em última análise, uma cobertura mediática responsável tem o potencial para prevenir a violência, promovendo simultaneamente a paz e a tolerância entre diferentes etnias e religiões.

António Guterres, Secretário-Geral das Nações Unidas disse[1] que “a diversidade é uma fonte de riqueza, não é uma ameaça (…). [Mas] só por si não garante a harmonia de uma sociedade“, referiu, acrescentando que, “para que haja efetivo pluralismo e uma coesão“, tem de haver “um grande investimento“, envolvendo governos, autarquias, líderes religiosos e sociedade civil. E, acrescentamos nós, jornalistas!

Assim, de modo a sensibilizar os media guineenses para a questão da PREV, o projeto Observatório da Paz – Nô Cudji Paz realizou nos dias 11 e 12 de maio de 2023, na Casa dos Direitos em Bissau, uma ação de formação destinada aos jornalistas. O evento contou com 41 participantes, dos quais 21 homens e 20 mulheres, afetos aos diversos órgãos de comunicação social de todo o país, públicos, privados e comunitários. A iniciativa visou dotar os jornalistas com conhecimentos e técnicas para a deteção de sinais de radicalização e extremismo violento.

Na cerimónia de abertura a presidente do Sindicato de Jornalistas e Técnicos de Comunicação Social – SINJOTECS, Indira Correia Baldé, reconheceu que existem sinais de radicalismo e extremismo na sociedade guineense. Para a presidente do SINJOTECS, “os jornalistas têm a responsabilidade de trabalhar na manutenção da paz, pelo que devem ser capazes de descortinar os discursos que possam pôr em causa a coesão social”.

Por seu turno, o Dr. Augusto Mário da Silva, presidente da Liga Guineense dos Direitos Humanos (LGDH), afirmou que “a imprensa guineense tem exercido um papel fundamental na preservação dos valores identitários do povo, e deve passar sempre pelo respeito pelas diferenças e coexistência pacífica entre as diferentes comunidades que compõem este rico e diversificado mosaico cultural”.

A LGDH reconheceu os desafios perante o contexto político-social atual, daí ter apelado à preservação da coesão nacional e à promoção do desenvolvimento sustentável e do bem-estar, para a consolidação da democracia e da paz, evitando amplificar atos que contribuam para provocar fissuras no tecido social guineense.

A formação abordou tópicos transversais à Prevenção do Radicalismo e Extremismo Violento (PREV), designadamente, noções gerais sobre o radicalismo e extremismo violento; liberdade de imprensa e de expressão face ao discurso de ódio; a dimensão do género na luta contra radicalismo e extremismo violento; e, por fim, o papel dos órgãos de comunicação social na PREV.

Os jornalistas presentes na ação de formação elogiaram a qualidade dos facilitadores e a pertinência dos temas abordados, os quais irão, segundo os próprios, contribuir para melhorar a sua perspetiva profissional e a qualidade do seu trabalho. A jornalista da Rádio Jovem, Vanilza Agostinho da Silva, falando em nome dos pares, não escondeu a sua satisfação pelos conhecimentos que adquiriu e assegurou que os mesmos irão contribuir significativamente na melhoria do desempenho dos profissionais da comunicação social na prevenção do radicalismo e extremismo violento na Guiné-Bissau.

Um dos tópicos que surgiu nas sessões de trabalho foi a pertinência da criação de uma rede de jornalistas para a PREV. Esperava-se um debate sobre essa oportunidade. Porém os jornalistas empoderados pela pertinência da temática, e quiçá pelo contexto eleitoral que se avizinhava (começaria oficialmente no dia seguinte), no segundo dia da formação deram um passo em frente e decidiram criar uma associação informal de jornalistas para a PREV, tendo inclusive, de entre 6 candidatos, eleito o jornalista Sumba Nansil, um conhecido radialista e membro da Rede Lusófona de Educação Ambiental, como Presidente da Rede de Jornalistas para a Prevenção do Radicalismo e Extremismo Violento na Guiné-Bissau.

A Dra. Madaleine Onclin, Chefe da Cooperação da Delegação da União Europeia na Guiné-Bissau, ao presidir à cerimónia de encerramento, referiu que os profissionais de comunicação social precisam deste tipo de formação de modo a poderem melhorar as suas capacidades de intervenção, designadamente no domínio da consolidação da paz, da tolerância, da serenidade e imparcialidade, bem como para lutar contra as fake news (desinformação), como forma de contribuir para a prevenção do radicalismo e extremismo violento.

 

O Observatório da Paz – Nô Cudji Paz é uma iniciativa do Instituto Marquês de Valle Flôr (IMVF) e da Liga Guineense dos Direitos Humanos (LGDH), com o apoio e financiamento da União Europeia e cofinanciamento do Camões – Instituto da Cooperação e da Língua, I.P. Pretende contribuir para o diálogo, promoção da paz e prevenção da radicalização e do extremismo violento na Guiné-Bissau através do reforço da participação, trabalho em rede e estabelecimento de parcerias estratégicas entre as Organizações da Sociedade Civil e outros atores sociais e políticos.

[1] Guterres falou no evento “Encontros de reflexão comemorativos dos 50 anos da fundação da Comunidade Islâmica de Lisboa” na Mesquita Central de Lisboa a 16 de março de 2018.